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# Diário 4 - Práticas em Justiça Restaurativa

Em agosto de 2019 realizamos a formação em Práticas de Justiça Restaurativa, com ênfase em Processos Circulares, segundo metodologia da Kay Pranis, por uma iniciativa da Dra. Renata S. Guidugli Gusmão, juíza titular do Juizado Especial Criminal de Santos que desde abril deste ano mantém ações articuladas no Núcleo de Justiça Restaurativa no Fórum Cível de Santos/SP.

As práticas de Justiça Restaurativa têm sido vivenciadas desde 2015 na cidade e consolidou-se como política pública interinstitucional em 2017 por meio da lei n° 3.371 de julho/2017 e atualmente mantém 03 Núcleos de Justiça Restaurativa nos três poderes: Executivo com o Núcleo de Educação para a Paz, articulado com a Secretaria Municipal de Educação; no Judiciário, situado no Fórum Cível de Santos e no Legislativo na Câmara dos Vereadores de Santos.

Para nós, foi uma experiência intensa, de muitas trocas e aprendizados. Encontramos um grupo formado por pessoas que atuam em diferentes áreas: advogadas, mediadores, assistentes sociais, psicólogas, professores e etc. demonstrando que a Justiça Restaurativa articula em sua órbita pessoas interessadas na investigação sobre os modos de construção do justo, na reflexão sobre sobre a produção de outros mundos.

A Justiça Restaurativa se apresenta como um novo paradigma ético e por isso, mais do que “ensinar” técnicas de solução de conflitos ou como manejar um círculo de Construção de Paz procuramos, ao longo destes encontros, formular questões de maneira provocativa, a partir da prática do pensamento filosófico, produzindo reflexões para um entendimento mais aprofundado do potencial transformativo do processo da Justiça Restaurativa da maneira como o vemos.

Então, de início foi preciso considerar a filosofia prática. O que é? Para que serve? Quem pode filosofar? Estas perguntas não buscaram ser respondidas, mas abrir ao exercício do pensamento, da reflexão sobre nossas próprias crenças sobre violência, poder, justiça, punição, verdade e outros conceitos caros à Justiça Restaurativa e sem os quais não é possível promover nenhum tipo de deslocamento ou mudanças sustentáveis à uma cultura que busque paz!

A filosofia prática nos convida a pensar como ato, convoca a uma qualidade de presença diferente, como corpo por onde acontecem os atravessamentos, os encontros e a busca pelo aumento de nossa potência de agir. Estes são passos importantes no caminho das práticas em Justiça Restaurativa cuja matéria prima são os conflitos. E o que são os conflitos, senão encontros que produziram ideias inadequadas? Cristalizaram acontecimentos no passado? Fixaram papéis imaginários de vítimas e agressores? E tornaram a busca por justiça num desejo mascarado de vingança?

As práticas de Justiça Restaurativa, são pautadas especialmente em processos circulares, forma geométrica que confronta a lógica verticalizada, hierárquica e produtora de corpos marcados pelo poder. Serve ao encontro, à contação de histórias em um espaço seguro, à expressão da raiva e da dor, à construção de novas subjetividades que considerem o meio pelos quais foram antes construídas. E para tanto, é preciso manter um ponto de vista duplo: crítico e criativo que sustente o caos e a tensão presentes num processo circular. Certamente seria mais fácil “ensinar habilidades mágicas” ou um manual de bom senso aos facilitadores, mas isso não seria capaz de dar dimensão à complexidade dos processos e práticas de Justiça Restaurativa que vão muito além de sentar todos os envolvidos num mesmo círculo.

Aprendemos nestes encontros que nossa liberdade passa por nossa potência de agir e que no exercício ético de convivência é possível sermos co-criadores de novos mundos. De algum modo, nenhum de nós escapou da confusão e choque necessários aos novos caminhos para o pensamento e certamente, somos diferentes do que éramos antes.

Para nós, mais um aprendizado compreendendo nossa capacidade de afetar e sermos afetadas!




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